Na proposta de arcabouço fiscal enviada ao Legislativo, governo propôs que, no caso de descumprimento das metas fiscais, o presidente da República terá de encaminhar uma mensagem ao Congresso Nacional. Pela regra atual, chefe do Executivo pode ser acusado de crime de responsabilidade. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, minimizou nesta segunda-feira (24) que a proposta de arcabouço fiscal, ou seja, a nova regra para as contas públicas, acabe com a punição de autoridades no caso de descumprimento das metas fiscais. "Tenho ouvido esse tipo de comentário, mas ninguém pune o Banco Central por não cumprir meta de inflação. O que eu acredito é você ter regras que tornem a gestão mais rígida. Isso eu acredito. Vai tornando mais rígida a meta. Mas o resultado fiscal depende do Congresso, depende do Supremo, não depende só do Executivo", declarou o ministro da Fazenda. O ministro também questionou a regra atual, o teto de gastos, que, em sua visão, é dura, mas também teve de ser alterada várias vezes nos últimos anos para que não fosse descumprida. "O que adianta você fazer uma regra dura, como o teto de gastos, e depois ficar aprovando emenda constitucional, aprovando teto. É um faz de conta, é melhor ter uma regra correta, uma regra sustentável, uma regra cobrável pela sociedade. Mas, enfim, o Congresso tem sua autonomia e certamente também vai conversar com o Executivo", afirmou Haddad.Arcabouço fiscalO proposta de arcabouço fiscal, apresentada no fim de março pela área econômica, extingue os crimes de responsabilidade pelo não atingimento de metas fixadas. Em seu lugar, propõe que o presidente da República encaminhe uma mensagem ao Congresso Nacional em caso de descumprimento das metas de resultado das contas públicas. No texto, terá de explicar as razões para o descumprimento da meta e as medidas que serão adotadas para correção.Com isso, a regra fica parecida com o regime de metas de inflação, que determina que o presidente do Banco Central seja obrigado a publicar uma carta pública em caso de descumprimento do teto do sistema de metas.Esse documento é encaminhado ao ministro da Fazenda, presidente do Conselho Monetário Nacional. Nos últimos dois anos, a meta de inflação foi descumprida, e cartas públicas foram divulgadas pela instituiçãoO presidente do BC atribuiu estouro da meta de inflação de 2022 a preço do petróleo e retomada da economiaPara que essas metas fossem cumpridas, economistas avaliam que a taxa básica de juros, atualmente em 13,75% ao ano (o maior nível em mais de seis anos, e que representa a maior taxa real do mundo) teria de ter subido mais ainda nos últimos anos.O atual patamar da taxa de juros continua sendo alvo de crítica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nesta segunda-feira, em Portugal, Lula afirmou que o juro alto é um problema para o país, e declarou que "ninguém toma dinheiro emprestado a 13,75%".O Banco Central, autarquia independente, responsável por definir esse patamar, diz que os juros altos são necessários para controlar a inflação. O efeito colateral, no entanto, é que esse controle também "esfria" a economia, ou seja, reduz o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).Na última semana, o presidente do Banco Central, Roberto Campos, afirmou em eventos em Londres que a queda da inflação é mais lenta que o esperado, que a batalha "não foi vencida" e que pode não haver um corte na Selic no curto prazo, como esperam o governo e parte do mercado.Sem bloqueio de gastosQuestionado sobre o fim da obrigatoriedade dos bloqueios preventivos de gastos públicos, que também foi proposta por meio do arcabouço fiscal, Haddad afirmou que esse tipo de expediente "funciona mal"."Bloqueio preventivo a cada dois meses funciona mal. É melhor ter um fluxo contínuo e que você vai monitorando as despesas do que você ter um garrote que é um outro faz de conta. Você acaba prejudicando a gestão dos recursos públicos ao invés de fazer uma gestão macroeconômica consistente. Eu acho que é que é continuo é melhor para o fim de gerenciamento do orçamento", disse o ministro da Fazenda.Nos últimos anos, para cumprir o teto de gastos e as metas fiscais para as contas públicas, diferentes governos tiveram de autorizar bloqueios orçamentários para equilibrar o orçamento. O texto do novo arcabouço fiscal, porém, tornou facultativo ao governo o contingenciamento (bloqueio) de despesas para cumprimento das metas fiscais.A proposta para o novo arcabouço fiscal fixa metas para as contas públicas e traz uma banda (piso e teto) para o crescimento das despesas. Enquanto a regra foca no aumento de arrecadação para tentar evitar descontrole das contas públicas, analistas avaliam que faltam indicações mais claras sobre o controle de gastos públicos e, também, de medidas para reduzi-los .Com base nas novas regras, levantamento da corretora Warren Rena indica que haverá uma necessidade de ao menos R$ 254 bilhões aumento de arrecadação, até 2026 para atingir o piso das metas de resultado primário do arcabouço fiscal apresentado pela equipe econômica -- indicando que pode haver aumento da carga tributária, possibilidade que o governo nega.