Ministros da Agricultura e dos Povos Indígenas divergem sobre o projeto aprovado pela Câmara. Texto limita demarcação de Terras Indígenas. Os ministros Carlos Fávaro (Agricultura) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas) se reuniram, de forma separada, nesta terça-feira (30) com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Na saída, os dois comentaram a proposta do marco temporal na demarcação de terras indígenas, que horas depois foi aprovada pela Câmara dos Deputados.
O projeto determina que só poderão ser reservadas áreas aos povos indígenas que já eram ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
Fávaro, defensor da matéria, afirmou querer "pacificação", mas que a demarcação de terras não pode ocorrer "em detrimento de produtores que estão há centenas de anos com propriedades titulares".
"Eu defendo a pacificação. Eu entendo, compreendo que os povos indígenas precisam, em alguns pontos, de uma atenção especial, de um pedaço maior de terra. Mas isso não pode ser em detrimento de produtores que estão há centenas de anos com propriedades titulares. Então, precisamos achar o bom termo. Eu entendo que isso vai acontecer, com moderação", afirmou o titular da pasta da Agricultura e Pecuária.
Do outro lado, Guajajara veio pedir "cautela" a Pacheco na apreciação do projeto. A ministra dos Povos Indígenas afirmou que o presidente do Senado garantiu a ela "participação de todos os interessados" no debate e que a proposta não será votada "de forma atropelada".
"Haver empenho, não quer dizer ter maioria. Houve sim articulação, conversas. Mas tem pautas que infelizmente não há essa compreensão e adesão da maioria da Câmara [...] Para nós o que interessa nesse momento é a gente garantir que o compromisso do presidente Lula seja cumprido, que é o destravamento da demarcação dos territórios indígenas", afirmou Guajajara.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), classificou que a forma como a matéria foi aprovada pelos deputados é "equivocada". "Você quer voltar 40 anos na história. Não é razoável", disse o senador.
Antes da votação na Câmara, Rodrigo Pacheco adiantou que, no Senado, ainda haverá "tempo para debate".
"O que eu falei de cautela, prudência, é submeter à comissão antes de submeter ao plenário, permitindo que quem queira debater esse tema possa ter o tempo também no Senado para esse debate. O que eu falei da busca de um consenso é porque os personagens envolvidos nesse tema, a Presidência das duas Casas, o STF, os setores da sociedade podem sentar à mesa para ter um diálogo, identificar convergência. A votação na Câmara pode inaugurar essa fase de conciliação no curso do debate aqui no Senado", pontuou Pacheco.
Além da discussão no Congresso, o marco temporal para demarcação das terras indígenas também está em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte avalia uma ação envolvendo uma terra indígena em Santa Catarina, mas a decisão terá repercussão em todos os processos do tipo no país.
Tanto o texto que tramita na Câmara dos Deputados quanto a ação no STF tratam da aplicação de um marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Ou seja, afirma que os povos originários só têm direito às terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
Na prática, a tese permite que indígenas sejam expulsos de terras que ocupam, caso não se comprove que estavam lá antes de 1988, e não autoriza que os povos que já foram expulsos ou forçados a saírem de seus locais de origem voltem para as terras.
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