Em entrevista ao g1, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirma que simplificação de impostos pode ser o principal gatilho para uma nova rodada de investimentos estrangeiros no país. Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)
Iano Andrade/Agência de Notícias da Indústria
Não há setor mais satisfeito com a reforma tributária do que a indústria. A simplificação de impostos e o fim do acúmulo de tributos ao longo da cadeia produtiva prometem destravar um alto custo de produzir no Brasil.
O próximo passo dos industriais, agora, é monitorar o andamento da reforma para que se preserve a espinha dorsal do texto: unificar os impostos e garantir os créditos tributários, com retorno rápido.
A perspectiva é positiva, já que a sinalização dos senadores é de manutenção no que há de principal na reforma. Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, basta a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição para que empresários passem a abrir a mão para investimentos.
"O setor produtivo vive muito das expectativas. Com expectativa positiva no futuro, já se começa a trabalhar de acordo. (...) Isso já vai melhorar muito o ambiente de negócios no Brasil", diz Andrade em entrevista ao g1.
Junto com a isonomia, contudo, vão-se embora alguns benefícios concedidos à indústria ao longo dos anos. A Zona Franca de Manaus foi preservada, mas cairão benefícios fiscais concedidos a empresas que se instalaram em regiões mais remotas do país.
Para a CNI, não será motivo de problema. A expectativa de Andrade é que estados passem a investir em diferenciais de infraestrutura, educação e capacitação para atrair empresas para dentro de suas fronteiras.
"Os estados podem continuar oferecendo incentivos e competindo entre si. Mas, agora, os incentivos não precisam mais ser tributários".
Veja abaixo os principais trechos da entrevista.
g1 – Já é possível estimar um ganho potencial que a indústria vai ter com a reforma tributária?
Numericamente, não. A indústria é o setor que mais paga imposto no Brasil. Nós pagamos 34% do total dos impostos federais, e em torno de 40% dos impostos estaduais. Não temos ainda uma alíquota definida, mas as estimativas giram em torno de 25%. Então, sim, tem um ganho tributário importante para a indústria.
Mas estão entendendo errado essa redução, como se ela fosse ser compensada com uma oneração excessiva de outros setores. O setor agrícola não será mexido, e o setor de serviços, que hoje é beneficiado, só é consumido por uma população de renda mais alta.
Além do mais, a simplificação dos impostos é uma questão que beneficia a todos os setores. Qualquer empresa tem hoje uma estrutura muito grande para o cálculo do imposto e dos créditos gerados. Há uma série de dificuldades que serão facilitadas e gerarão redução de custos.
Não só para a indústria, mas para todos os setores, há um potencial de destravar investimentos que terão benefício direto para o crescimento da economia e do país. Todos os setores precisam de investimento, pois é assim que se gera emprego.
g1 – Indo além da questão desse potencial de crescimento e das expectativas com a economia, como a reforma vai impulsionar a decisão do empresário em investir?
Pelo simples fato de que hoje nós pagamos uma tributação elevada nos investimentos. Além disso, pagamos antecipadamente. No caso do ICMS [Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços], se você compra máquinas e equipamentos, paga antes de começar a produzir.
O mesmo vale para a isenção de exportações. A carga tributária embutida nas exportações fica escondida dentro das cadeias produtivas. Tem setor que chega a 10% de tributos escondidos.
Como a tributação passa a ser sobre o consumo, vai ser totalmente desonerada como acontece nos outros países. É um benefício uma redução de custo muito grande, para todos os setores brasileiros.
As exportações de bens manufaturados, que é o que nós precisamos exportar, terão uma ampliação de mercado enorme. Somos grandes exportadores de bens primários, mas o produto elaborado não tem competitividade por conta da taxação e fica para trás. É algo que vai beneficiar demais a balança comercial brasileira.
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g1 – Mas são todos efeitos da reforma completa, após o período de transição. E no curto prazo?
O setor produtivo vive muito das expectativas. Com expectativa positiva no futuro, já se começa a trabalhar de acordo. De imediato, alguns benefícios aparecem, conforme as empresas começam a mudar a sua visão de futuro. Isso já vai melhorar muito o ambiente de negócios no Brasil.
E o governo, com o ministro Fernando Haddad e o ministro Geraldo Alckmin, já estão pensando também em outros estímulos, como a depreciação acelerada. Ela não representa uma redução da receita da União, mas ela representa um fluxo de caixa que favorece os investimentos.
g1 – Se tivesse que escolher apenas um aspecto para representar o grande ganho da reforma tributária para a economia, qual seria?
É muito complicado escolher um só. O Brasil tem muitas prioridades, qual delas você escolhe? Eu escolheria educação.
Mas, na reforma, a principal é a simplificação tributária. Ela representa a melhoria do ambiente de negócios.
As outras são tão importantes e evidentes — a desoneração das exportações, dos investimentos, a redução da carga tributária, a obrigatoriedade da formalidade —, mas a complexidade que se criou no sistema tributário brasileiro é uma loucura. Você não consegue acompanhar as mudanças, os regimes, as portarias. Tem que ter uma estrutura enorme.
O Brasil precisa muito de investimento externo, de trazer recursos de outros países. Os árabes estão interessadíssimos em investir no Brasil, e tem muitos recursos, mas é extremamente complicado você explicar como funciona o sistema tributário brasileiro.
Para nós, já é difícil de entender. Para explicar para um inglês, um alemão, um japonês ou um árabe é complicadíssimo.
g1 – Voltando para o 'bolo' inteiro, qual a importância da reforma para a agenda de reindustrialização do país que o governo tem prometido desde a campanha eleitoral?
Nós já estamos nessa agenda da reindustrialização. Felizmente, o vice-presidente Alckmin e o ministro Haddad têm uma visão da necessidade e da importância da indústria para o crescimento do país.
Eles têm a visão de que houve uma desindustrialização precoce e desnecessária no passado recente. E tem também a visão de que a indústria é que faz com que os estados possam progredir e se desenvolver, por meio de tecnologia e inovação, mas também com as receitas dos estados e municípios.
Eu gostaria de ver 27 estados como São Paulo. Por que São Paulo é um estado que tem menos problemas fiscais, de investimentos na infraestrutura? Porque São Paulo é um estado rico, que recebe 30% do PIB brasileiro. Isso está nos impostos que vem da indústria.
A agenda mostra que há um foco na atração de investimento industrial e no desenvolvimento da indústria. Estamos vendo que, realmente, tem uma perspectiva não só de desoneração, mas uma perspectiva de atrair investimento por meio das medidas de crédito.
O Brasil já foi uma potência industrial no passado e perdemos isso por falta de discussões sobre uma política industrial. Hoje, todos os países — Estados Unidos Alemanha, França China — todos estão com políticas industriais bem arrojadas, então não podemos perder esse espaço.
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g1 – Sobre a situação dos estados, uma das preocupações está em unidades industriais que ocuparam espaços por meio de subsídios. Como fica a situação desses estados, que concederam benefícios para atrair empresas e vão deixar de ter esse diferencial?
A questão dos estados é interessante de analisar. À primeira vista, parece óbvio que o empresário escolheria estados do Sul. Mas, ao decidir por um investimento, não se olha apenas um fator.
Onde está a matéria-prima? O seu mercado é interno ou externo? Onde estão seus colaboradores? Em um contexto assim, a fonte de recursos, a experiência e a qualificação profissional podem ser vantagens comparativas que cada estado oferece, por exemplo.
Veja hoje, que você tem investimentos fortíssimos no Nordeste para o mercado de inovação e tecnologia. Pernambuco virou um polo de tecnologia, com mão de obra qualificadíssima e de fornecimento de energia limpa.
Os estados podem continuar oferecendo incentivos e competindo entre si. Mas, agora, os incentivos não precisam mais ser tributários.
Os governos estaduais, por meio dos fundos que vão gerir, podem modelar incentivos de crédito, de recursos humanos, de uma infraestrutura melhor, entre outros.
Eu acredito que os incentivos vão ficar mais claros, mais transparentes e a disputa vai ser maior. Os estados terão mais interesse em investir em infraestrutura para poder atrair empresas.
g1 – Com a reforma chegando ao Senado, quais as preocupações do setor durante a tramitação?
Trabalhamos bastante com senadores, mesmo no período de recesso. Temos discussões pendentes, principalmente sobre algumas emendas colocadas de última hora na proposta.
A principal preocupação é o artigo 20, que é a possibilidade de estados criarem taxas de fiscalização. Isso é um absurdo, até porque não há limite para essas taxas. Isso pode ser um problemão.