A experiência já vem dando resultado no Rio Grande do Sul. Pessoas fazem compra num mercado
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A reforma tributária promulgada nesta quarta-feira (20) pelo Congresso Nacional criou um sistema para devolver aos mais pobres parte do imposto que pagaram.
"Eu costumo pegar mais ou menos uma bandeja de ovo, um óleo, uns dois açúcares, cinco quilos de arroz, um feijão. O grosso, né? Porque faz falta, ainda mais quando se tem um monte de criança, né?", diz a manicure, Mayara Alves Soares.
Essa é a compra que a Mayara consegue fazer com o dinheiro do cashback. Ela recebe R$ 100 a cada três meses — um programa social do governo do Rio Grande do Sul, que devolve parte do ICMS, imposto estadual, para a população mais pobre.
Como chefe de família, a Mayara precisa gastar bem cada real que vem no cartão. Ela cria cinco filhos sozinha.
"Ajuda bastante. Porque geralmente ainda vem numa época do mês que a gente já tá contando as moedas. Então, ajuda bastante", destaca.
Em Porto Alegre, funciona o centro de distribuição do cartão do programa na cidade. A iniciativa surgiu com o desafio de reduzir o peso do imposto estadual sobre as pessoas mais pobres — 96% dos beneficiados no programa têm renda de até um salário mínimo por mês.
Podem entrar no programa as famílias que recebem Bolsa Família ou que tenham dependente matriculado na rede estadual de ensino médio.
O governo estadual paga um piso de R$ 100 a cada trimestre, valor que pode subir se o beneficiário usar o CPF para compras com emissão de nota fiscal.
"Na medida que o cidadão pede pra colocar o CPF, obrigatoriamente, o estabelecimento vai ter que emitir o documento, se não, não há como fazer o vínculo. Aí gera esse efeito de estímulo à formalização. E a formalização tá vinculada diretamente ao aumento da arrecadação. Quem é que tá ganhando com o aumento da arrecadação? Bom, primeiro lugar toda a sociedade. Mas também muito diretamente o próprio município onde se situa a empresa, porque isso vai contar no valor adicionado, tem uma série de circunstâncias positivas pra localidade", explica Giovanni Padilha, subsecretário adjunto da Receita Estadual, Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul.
As famílias gastam grande parte do valor com alimentação: 85% dos gastos são com compras em mercados, padarias, açougues; 7%, em farmácias.
"Mas não existe nenhuma limitação. Se a família quiser usar pra serviços, cortar o cabelo etc também pode usar o cartão porque ele é aplicado pra qualquer tipo de consumo que a família quiser realizar", completa Giovanni.
Esse mecanismo de devolução de impostos vai passar a existir em todo o país a partir com a reforma tributária.
As regras do cashback, como os valores e quem poderá receber, ainda precisam ser aprovadas pelo Congresso em uma lei complementar. Essa regulamentação será analisada no ano que vem.
"Com um sistema cashback, você já começa diferenciando entre uma família mais pobre e uma família mais rica. Você devolve o valor pago em taxa à família pobre e deixa a família rica pagar a taxa porque ela tem mais capacidade de pagar isso. O Brasil tem as condições pra implementar, porque o pode usar o cadastro único pra identificar as famílias que são mais vulneráveis, que podem se beneficiar desse sistema", ressalta Shireen Mahdi, economista principal do Banco Mundial para o Brasil.
Entenda em 7 pontos a reforma tributária
A reforma tributária traz mais uma ação em favor da população vulnerável. Produtos da cesta básica, uma lista de alimentos considerados essenciais, terão um tratamento especial já que representam a maior parte dos gastos de famílias pobres.
Hoje, alguns itens da cesta básica são isentos de impostos federais. E cada estado tem liberdade para definir quais produtos terão imposto estadual menor ou zerado.
Com a reforma, existirá uma única cesta básica nacional que não existe hoje. E uma nova lei, que ainda precisa ser aprovada no Congresso, vai definir a lista de produtos considerados essenciais, com imposto zero em todo o país.
"Nós temos a cesta básica nacional isenta, nós temos uma redução na higiene, redução na limpeza, nós temos a redução muito importante para saúde menstrual, que é de até 100%, então, ou seja, nós temos os instrumentos necessários para construir uma redução de impostos pra população brasileira. Uma cesta que realmente reduza impostos. Esse é o norte, esse é o principal desafio do Congresso, do governo e da sociedade brasileira, reduzir ou extinguir, ou levar a zero mesmo a isenção, os impostos dos alimentos", destaca João Galassi, presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).