Tribunal constatou que contratação prevista na lei não tem respaldo técnico e pode trazer riscos ao planejamento setorial e prejuízos aos consumidores de energia. Usina termelétrica no AmazonasDivulgaçãoO Tribunal de Contas da União decidiu nesta quarta-feira (25) recomendar ao Ministério de Minas e Energia que avalie a possibilidade jurídica de não contratar parte das usinas termelétricas movidas a gás natural. A contratação foi imposta pela lei que autorizou a privatização da Eletrobras.A contratação de 8 gigawatts de energia gerada por novas usinas térmicas a gás natural, a serem construídas em regiões específicas do interior do país, foi uma exigência imposta pelo Congresso para aprovar a lei que permitiu que a Eletrobras fosse privatizada.A área técnica do tribunal concluiu que essa contratação, apesar de prevista em lei, não tem respaldo técnico e se choca com diversas outras leis que regem a administração pública e o setor elétrico brasileiro.Além disso, se levada adiante, pode trazer riscos ao planejamento setorial e prejuízos aos consumidores de energia e à competitividade do setor. LEIA TAMBÉM: Com pouca oferta, governo contrata só três termelétricas em leilão imposto por lei da EletrobrasA Empresa de Pesquisa Energética, estatal responsável pelo planejamento do setor elétrico, por exemplo, constatou a necessidade de contratar apenas 2 dos 8 GW impostos pela lei da Eletrobras."Contratar térmicas a gás de 6 mil megawatts é um pouco fora da real necessidade, e isso onera a conta dos consumidores, sem estudos técnicos que mostrem a real necessidade", afirmou o ministro Benjamin Zymler, relator do processo.Porém, como destacou o próprio ministro, não cabe à Corte de Contas fazer o controle de constitucionalidade de uma lei. Por isso, o tribunal decidiu apenas recomendar que o MME avalie a possibilidade jurídica de não fazer a contratação dessas térmicas, "sob o risco de contratar energia de reserva de forma ineficiente e antieconômica, onerando desproporcionalmente o consumidor e reduzindo a competitividade do país".Possível inconstitucionalidadeNa avaliação do TCU, a contratação imposta pelo Congresso fere os seguintes valores e princípios estabelecidos na Constituição e em outras leis:planejamento setorial e a eficiência;modicidade tarifária;proteção aos interesses do consumidor no tocante às políticas nacionais para o aproveitamento racional das fontes de energia;proteção dos interesses do consumidor quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos; epromoção da livre concorrência."Com todas as vênias, o Poder Legislativo acabou adentrando um terreno técnico que incumbe ao MME, à Aneel a ideia de regulação do setor de energia elétrica", resumiu Zymler.O TCU também decidiu enviar cópia do processo para que o Ministério Público Federal avalie a possibilidade de entrar com uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal.EntendaDurante a tramitação da proposta que autorizou a privatização da Eletrobras, o Congresso Nacional incluiu no texto a necessidade de contratação de 8 GW de energia gerada por novas térmicas a gás natural. Foi uma contrapartida exigida pelos parlamentares, em especial pela bancada do "gás".No setor elétrico, as usinas que serão contratadas por imposição do Congresso ficaram conhecidas como "térmicas jabutis". O termo "jabuti" é usado no jargão político quando é incluído em um projeto um item estranho ao texto original.Associações de consumidores contestam a necessidade de contratação desses 8 GW. Primeiro, porque afirmam que o planejamento de longo prazo do setor não aponta a necessidade dessa geração adicional.Segundo, porque a energia gerada pelas térmicas é mais cara e poluente que as demais fontes – será o consumidor que vai pagar a conta, através de um encargo incluído na fatura de energia.Terceiro, as térmicas terão de ser construídas em regiões onde atualmente não há escoamento de gás natural. Portanto, toda a infraestrutura terá de ser construída – e essa conta também pode acabar sendo bancada pelo consumidor de energia.No ano passado, o governo realizou um leilão para contratar parte dos 8 GW previstos na lei.Nesse leilão, foram contratados 729,25 megawatts de energia que serão oferecidos por três usinas, a serem construídas na região Norte. O início do fornecimento será em 31 de dezembro de 2026 e o prazo de contrato será de 15 anos.