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Economia

Coquetelaria em alta traz a "Copa do Mundo" de bartenders ao Brasil; saiba como chegamos até aqui

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Cidade de São Paulo recebe, pela primeira vez, a etapa mundial do World Class, principal competição do setor. Mercado de destilados ainda é minúsculo, mas aposta na capacitação de profissionais para surpreender e 'morder' parte do consumo nacional de cerveja. A bartender Vitória Kurihara quando foi anunciada como campeã da etapa nacional do World Class

Bruno Basila/Pridia

Aos 24 anos, Vitória Kurihara tenta um feito inédito: ser a primeira brasileira a vencer a "Copa do Mundo" de bartenders. A competição começa nesta terça-feira (26), e acontece pela primeira vez em São Paulo.

Em sua 14ª edição, o World Class traz representantes de 54 países ao Brasil, em busca do título de melhor bartender do mundo em 2023. São quatro desafios temáticos de mixologia e apresentação de coquetéis, e uma etapa final que aponta o campeão. Ou campeã.

A disputa chega ao Brasil para coroar um momento especial para a coquetelaria no país. De anos para cá, o consumidor brasileiro tem buscado novas opções de lazer, aquecido o mercado de bares especializados em coquetéis e enaltecido os bons bartenders.

É um fenômeno parecido com o que aconteceu anos atrás com a gastronomia, que revelou "chefs celebridades" e ganhou uma enorme variedade de realities competitivos na TV e no streaming. A coquetelaria vem nessa mesma esteira, apesar de ter por aqui um desafio evidente: a cerveja.

De tudo o que é consumido de bebidas alcoólicas no país, a gelada representa mais de 90% do mercado, segundo dados da Euromonitor International. Em 2022, foram mais de 15 bilhões de litros consumidos, contra cerca de 750 milhões de litros de bebidas destiladas.

A base dos coquetéis, porém, precisa ser observada em detalhes. Do período pré-pandemia para cá, o consumo de gin e whisky mais que dobrou. O crescimento dos destilados só não é maior porque a cachaça, símbolo brasileiro do setor, estagnou na casa dos 500 milhões de litros anuais.

Mas o gin, por exemplo, tem números impressionantes: na janela de cinco anos, passou de 2,2 milhões para 17 milhões de litros anuais. A cada ano, também foi o protagonista das "febres" do momento nos barzinhos: gin tônica, negroni e fitzgerald.

Essa é a aposta da Diageo, organizadora do World Class, ao trazer a competição para o Brasil: aumentar o repertório do consumidor brasileiro e treinar bartenders para surpreender o cliente.

"O legado do World Class é essa troca de experiências e aprendizado entre os bartenders. O mercado de cerveja ser tão grande só nos mostra que temos espaço para crescer", diz Manoela Mendes, diretora do portfólio Reserve da Diageo Brasil.

Um amargo que cai bem

Curiosamente, a origem dessa onda recente de desenvolvimento da coquetelaria brasileira está na cerveja.

Segundo Rodrigo Mattos, analista sênior da Euromonitor International, a entrada da Heineken no portfólio de cervejas do país ajudou, em um primeiro momento, a ampliar os horizontes do consumidor, com seu sabor mais amargo que as marcas concorrentes.

Começou a ter um treinamento do paladar para aceitar amargores, e até valorizar o amargo. Isso causou a ascensão do Campari, por exemplo, e despertou interesse de investimento de outras empresas.

Foi uma onda sem volta: as "modas" pegaram e as empresas de destilados passaram a trazer seus melhores rótulos para o Brasil. Marcas que nem estavam nas prateleiras brasileiras passaram a chegar. E bartenders das antigas perceberam que os insumos importados, como bitters e licores, ficaram mais fáceis de serem encontrados.

Tanto Mattos, pelo lado da análise de consumo, como Manoela Mendes, com o viés da empresa do setor, citam uma "elevação de patamar" do mercado. No início da década de 2020, o brasileiro havia consolidado um movimento social de quem passou a "beber melhor".

Chegou, então, a pandemia. Com as portas de bares e restaurantes fechadas, o entusiasta de coquetéis teve que aprender por conta a manejar seus drinks para os momentos de descontração em casa, com pouca ou nenhuma companhia.

O resumo é que, mesmo com a catástrofe para empresários do setor, o consumo de bebidas alcoólicas não recuou durante a crise sanitária.

Efeito parecido aconteceu no mercado de vinhos em 2020. O g1 mostrou como as vendas subiram expressivamente no primeiro ano de pandemia e o consumo aumentou quase 20% em relação ao ano anterior.

Assim, o retorno do consumidor ao bar trouxe dois grandes efeitos: o brasileiro agora bebe mais em termos gerais e também entende melhor o que está bebendo.

"Hoje, nossa taxa de crescimento futuro é muito maior para destilados que o mercado americano ou europeu. Lá, há uma tendência de buscar opções de zero álcool, enquanto aqui é de aumento de consumo para os próximos anos", diz Mattos, da Euromonitor.

E não há ponto sem nó: dentro da agenda do World Class no Brasil, há uma série de palestras e encontros entre profissionais do setor, para que conheçam as técnicas e produtos da empresa. Já na semana seguinte, um programa de parceria com bares trará descontos para estimular o público a experimentar novas receitas.

A bartender Vitória Kurihara durante um dos desafios da etapa nacional do World Class

Bruno Basila/Pridia

Bartenders em voga

Como acontece com chefs premiados, vencer uma competição como o World Class coloca o bartender em outra prateleira.

Desde que venceu a etapa nacional da competição, em junho, a curitibana Vitória Kurihara passou a se acostumar com clientes que foram ao DUQ Gastronomia, em Curitiba, em busca não só de um bom coquetel, mas também de vê-la trabalhar.

O mais legal é que, a partir do momento que as pessoas começam a entender a coquetelaria, entendem também que tudo aquilo não é só pelo álcool. É uma experiência.

Junto com as preparações técnicas para a etapa mundial, Vitória foi forçada a refletir sobre planos para a carreira. O momento único de exposição, porém, não a fará correr para colocá-los em prática.

Em entrevista ao g1, a bartender conta que uma de suas prioridades é valorizar e ajudar a desenvolver a coquetelaria do Paraná. Ela é categórica em dizer que não pretende deixar Curitiba, mesmo que se torne a melhor bartender do mundo na próxima quinta-feira (28).

"Não porque eu não queira [sair do Paraná]. Tem várias oportunidades e 'famílias' que eu construí, pessoas que eu conheci, mas aqui é o lugar que me abraçou e onde me ensinou tudo que eu sei. Então, colocar em evidência a coquetelaria do Paraná é algo que eu devo para mim mesma" afirma.

Tem muita gente lutando por isso há muitos anos, e usar dessa visibilidade é um sonho de muita gente.

Gabriel Santana, sócio do Santana Bar, mostra seus troféus de campeão do World Class Brasil e Suíça (dir.)

Fábio Tito/g1

Quem está alguns estágios à frente no tempo é o bartender Gabriel Santana. Na falta de um título de World Class nacional, ele tem dois.

Santana passou 10 anos na Suíça, onde se formou em gastronomia. Foi para o bar porque se apaixonou pela hospitalidade, e a cozinha fica muito distante do calor do público.

Descobriu o World Class e decidiu disputar sua primeira edição ainda na Europa, com meses de profissão. Sentiu firmeza com o terceiro lugar e decidiu se preparar para o ano seguinte. Em 2017, venceu a edição suíça do concurso.

Quando decidiu voltar ao Brasil, tinha um belo "selo de qualidade" no currículo. Foi acionado por conhecidos e voltou ao país como chefe de bar do Benzina, que ficava na zona oeste de São Paulo.

Decidiu disputar novamente o World Class em 2018, desta vez no Brasil. Achou que tinha o mapa do sucesso, mas perdeu. "Foi um ótimo tapa na cara", conta. Voltou — humilde e motivado — para vencer em 2019.

O Benzina fechou as portas durante a pandemia de Covid. Quando foi possível retornar, o bartender entendeu que era hora de usar o holofote que havia conseguido nas competições. Criou, então, o Santana Bar.

Com certeza foi um fruto das conquistas. Ele não se chama Santana Bar por ego, mas porque é justamente uma 'esponja' de toda essa minha caminhada.

"A competição da minha vida não é mais gerar notas, é gerar sorrisos. Quanto mais pessoas vêm aqui e saem com o sorriso no rosto, mais isso se torna o meu troféu de cada dia", diz ele.

Ele confidencia, contudo, que não descarta uma nova incursão no World Class, em busca do título mundial — mesmo troféu que Vitória tenta buscar nesta semana.

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