No total, 1.408 pessoas foram encontradas nessa situação, um alta de 44% contra igual período de 2022, diz relatório da Comissão Pastoral da Terra. Conflitos em áreas rurais aumentaram 8%, para 973. Homens são resgatados em situação semelhante a trabalho escravo em plantação de milho em Santa Bárbara de GoiásMinistério do Trabalho/DivulgaçãoAs vítimas resgatadas de trabalho análogo à escravidão no campo chegaram a 1.408 no primeiro semestre de 2023, um recorde para o período em 10 anos e um aumento de 44% em relação a iguais meses de 2022.É o que mostra um relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), divulgado nesta terça-feira (10). O documento apontou ainda que:os conflitos no campo aumentaram 8% no 1º semestre deste ano, em relação a igual período de 2022. No total, foram 973 conflitos, sendo que a maioria foi por disputas por terra (714);os povos indígenas são 38,2% das vítimas de violência por conflitos de terra, seguida dos trabalhadores rurais sem terra (19,2%), posseiros (14,1%) e quilombolas (12,2%);o número de assassinatos no campo teve queda de cerca de 50%, para 14;os povos indígenas ainda são as maiores vítimas de assassinatos (6), seguidos dos trabalhadores sem terra (5), posseiro (1), quilombola (1) e funcionário público (1);houve um aumento da violência contra as mulheres no campo, que passou de 94 registros em 2022, para 107 em 2023;danos causados por contaminação por agrotóxicos atingiu 327 pessoas.O levantamento da CPT é feito com base em informações coletadas por agentes da pastoral pelo Brasil, notícias da imprensa e divulgações de órgãos públicos, movimentos sociais e organizações parceiras.Leia também:O que é trabalho análogo à escravidãoTrabalho escravo no campo: o que dizem trabalhadores, fiscais e pesquisadores sobre o recorde de resgatesResgates no campoOs resgates de vítimas de trabalho escravo em áreas rurais já haviam disparado e batido recorde no início do ano, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), obtidos pelo g1, na ocasião.Isso pode ser explicado pelo aumento das denúncias, avanço da terceirização, pobreza e falta de responsabilidade das empresas, segundo fiscais, associações e pesquisadores consultados pelo g1, em março deste ano.Já para a Comissão Pastoral da Terra, o aumento dos resgates demonstra que os órgãos de fiscalização estão mais atentos ao tema.Um dos casos de grande repercussão ocorreu durante a safra de uva, em fevereiro, quando 207 trabalhadores foram encontrados em situações degradantes de trabalho, no município de Bento Gonçalves (RS).Eles eram contratados pela empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde LTDA, que prestava serviços a três grandes vinícolas da região: Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton.As plantações de uva são consideradas lavouras permanentes, a 2ª maior atividade rural com vítimas resgatadas (331) de trabalho análogo à escravidão, no 1º semestre de 2023.Elas só perderam para as lavouras de cana-de-açúcar, onde 532 pessoas foram resgatadas. Uma das grandes operações ocorreu em março, em Goiás, quando o MTE flagrou 212 trabalhadores em condições degradantes, em fazendas de cana que iam do sul de Goiás até a cidade de Araporã, em Minas Gerais.Leia também:Pretas e pardas, do Norte e do Nordeste: perfil de mulheres submetidas à escravidão contemporâneaDisputas por terraA grande maioria dos conflitos no campo brasileiro continua sendo as disputas por terra (714), seguidas pelo trabalho escravo rural (102), conflitos pela água (80), ocupação e retomada de terras (71) e acampamentos (6). Quase 527 mil pessoas estiveram envolvidas nesses conflitos, o que representa uma pequena queda de 2% em relação ao ano passado.No que diz respeito apenas aos conflitos por terra, a pastoral afirma que 878 famílias sofreram com a destruição de suas casas, 1.524 com a de seus roçados e 2.909 com a de seus pertences. A CPT disse ainda que os maiores causadores das violências no campo foram fazendeiros (19,75%), governo federal (19,33%), empresários (16,95%), governos estaduais (13,31%) e grileiros (8,54%).Violência contra as mulheresA violência contra as mulheres em áreas rurais vem crescendo desde 2021, segundo a CPT. Somente no 1º semestre deste ano foram 107 registros.Segundo o instituto, o destaque foram os estupros de 30 adolescentes yanomami por garimpeiros, no mês de fevereiro. Outros casos são de mulheres que sofrem com intimidação (20), ameaças de morte (16), agressão (6), criminalização (5), cárcere privado (5), dentre outros."Lembrando que a mesma pessoa pode sofrer mais de uma violência numa mesma ocorrência", reforça a Pastoral.Em julho, o g1 fez um levantamento inédito sobre os casos de violência doméstica contra as mulheres em áreas rurais. Só em 2022, houve mais de 30 mil denúncias em 12 estados (saiba mais).Violência doméstica no campo: a saga de mulheres para denunciar agressões no meio ruralContaminação por agrotóxicosA CPT também faz um recorte sobre o número de violência contra pessoas, levando em consideração todos os tipos de conflito.Neste tipo de abordagem, houve um aumento expressivo no número de vítimas: de 418 no 1º semestre de 2022, para 779 no mesmo período de 2023. Os danos causados pela contaminação por agrotóxicos lideram este tipo de violência (327), bem como a contaminação por minérios (55). Outro destaque é para os aumentos nos casos de criminalização (45) e detenção de pessoas envolvidas na luta pelos direitos no campo (42), mesmo que a prisão efetiva tenha diminuído (de 74 para 29).Gente do campo: Dona Lourdes foi contaminada por agrotóxico e hoje vive de agroecologia